Essa é uma estoria contruida a partir de uma serie de elementos bricolados da mitologia grega, arabe, acontecimentos reais, um filme de terror, umas metaforas retardadas, elementos da biologia vestibulandica e uma dose moderada de surrealismo. Quem tiver interesse de entender mais da metade da brincadeira vai ter que pesquisar na mitologia grega underground alguns detalhes da historia do narciso e da persophne, alugar os filmes da série Profecia, estudar morfologia das angiospermas e me perguntar detalhes intimos da minha vida que eu nao vou responder. Se voce nao estiver afim de fazer nenhuma dessas coisas, espero que possa aproveitar o texto mesmo assim.I.
Não desta vez. Não de novo. Da ultima vez que eu fiquei esperando, lembro muito bem que eu me fodi. Um panteão de ninfas gostosas dando em cima de mim e eu respondendo “não, você não, sou fodão demais pra você...”. Até na Eco eu dei bota. Tudo bem que era extremamente enfadonha aquela maldita maldição que ela recebeu da Hera que a obrigava a falar o tempo todo repetindo as coisas que eu dizia. Mas pensando bem, tivesse eu tomado uns goles do meu Baco, encarava fácil. Enfim, não preciso terminar de contar que acabei me apaixonando pelo meu fastidioso reflexo naquele frívolo riozinho de quinta e que depois, sabe-se lá como, virei uma flor, meio que do nada. A mais bonita, modéstia a parte, mas ainda...uma pífia e mísera flor. Mas vamos ao que interessa.
Não sei se você se lembra do que aconteceu depois... Estava lá eu, em meio a floreios imaginativos que não vêm ao caso, quando te avistei vindo em minha direção, provavelmente separando-se de seu grupinho de mocinhas virgens, mitológicas e graciosas. Assim que te vi, floresceu em mim uma fervorosa paixão. Tá, vai, pra mais ser honesto... não foi bem assim que te vi, mas enquanto você corria pelos campos em minha direção deu tempo de me apaixonar. Enfim, foi bem rápido. O fato é que, como você bem sabe, quando você estava quase me pegando para me colocar em seu cesto, quando apenas centímetros de vegetação rasteira nos separavam, quando eu já sentia meu rígido e garboso tubo polínico se desenvolvendo e meu orgasmo floral prestes a culminar, abre uma estrondosa e sulforosa fenda infernal absolutamente do nada, no meio dos belos e verdejantes campos floridos do peloponeso, e você despenca (Pra ser um pouco mais honesto, foi esse o momento em que eu me apaixonei de verdade, porque você ostentava um harmonioso e glorioso decote.... fiquei olhando pra baixo – enquanto você caía - e imaginando como seria esta flórida vista antes dos seus um-kilo-e-duzentas a menos de comissão frontal...).
E imagine então a minha cara (ou sei lá.. meu androceu, gineceu, receptáculo floral, anterozóide... enfim, não freqüentava as aulas de biologia no colégio, estava ocupado demais me olhando no espelho) quando isso aconteceu. Mas que cazzo. Depois descobri que o filho da puta do Hades tinha resolvido sem mais nem menos me usar de armadilha pra te capturar. E mais filha da puta ainda, porque não satisfeito em não conseguir te conquistar na raça e no suor, te deu uma maldita semente de romã. A porra da semente de romã. Não fosse ela, nada disso estaria acontecendo. Mas isso não vai ficar assim. Não vai mesmo. Só porque você e esse tal anticristo tem uma historia juntos, namoram a sei lá quantos anos (apesar de não se verem direito e serem frios um com o outro), podem até já ter pensado em casar de papel passado e tudo mais. Que seja. Mas isso não fica assim não.
II.
Então, depois de engolir o meu prodigioso orgulho, lá fui eu pedir uma ajudinha a Alá. Nunca fui religioso, mas sempre me dei bem com o barbudo (que nunca encanou com meu comportamento narcísico, ao contrario do viadinho do Cristo que comia a puta da Maria Madalena o dia inteiro e ainda tinha cara de pau de chegar pros discípulos com papinho moralista). Contei pra ele da sua camiseta do Hamas e ele ficou todo animado. Ah, e também falei pra ele que, assim como você já me contou, você ainda não foi deflorada apesar do longo relacionamento com o nefasto.
Trocamos umas idéias verdejantes e no final das contas ele me transformou em homem de novo. Não tão bonito quanto antes, admito... nariz adunco, assimetrias faciais, cabelo curto (mas vou deixar crescer, como já te contei), uma voz de gralha fanha, meio fresco, grudento e metido a estiloso. Mas pelo menos podia falar, andar e brigar por você. Então peguei meu florete (já cansou dos trocadilhos, meu amor?) e desci ao inferno pra enfrentar aquele chifrudo ladrãozinho.
III.
Quando cheguei lá fui calorosamente recebido por uma flotilha de gazelas infernais ferozes que tinham cara de new metal com indie mas na verdade eram mó trues. Não me deram muito trabalho, e rapidamente o tinhoso veio ao meu encontro. Eu tentei conversar com ele, eu juro. Mas ele não falava nada, ficava lá quieto com uma cara inexpressiva e só abriu a boca pra reclamar que você era sempre do contra. Mas o coisa-ruim não queria desistir. Ou queria, não sei bem ao certo, porque não falava nada, o arrenegado. Foi quanto tive uma idéia brilhante.
Lembrei que ele tinha uma empresa capitalista na terra e que queria porque queria se tornar o presidente dos Estados Unidos. E também que isso tinha alguma coisa a ver com impedir o nascimento do novo Jesus Cristo. Foi então que negociei com ele : meu CD Antichrist Superstar do Marlyn Manson (que eu nem ouço mais) + meus vídeos do Michael Moore + um filme do David Lynch pela maldita semente de romã que ele te deu, mas guarda às sete chaves pra ter certeza de que você vai continuar apaixonada. Na verdade primeiro eu ofereci minha alma, já que eu não uso ela pra nada. Mas o cão também não acredita nessas idiotices. Então, enfim, fizemos a troca.
IV.
E você recebe então, finalmente, o prêmio da minha bricolada macunaímica e neo-romantica epopéia. Minha muiraquitã, esta semente de romã, eu te devolvo para que possa destruí-la (não te aconselharia a comê-la porque sabe-se lá o que aquele excomungado pervertido fez com ela) e não mais ficar sujeita a apaixonar-se por qualquer machinho beta que atravesse seu caminho. Agora a guerra santa pelo seu coração é mais justa. Mas quero deixar claro que isso não é absolutamente nenhuma demonstração de afeto. É apenas por falta do que fazer que conversei com Alá, atravessei o inferno, negociei com o belzebu, sentei o traseiro por horas a fio pensando nessa viagem toda e ainda saí por aí caçando romã.